Uma
garota escreveu ao blog contando sua história. Uma vida densa como céu que
antecede a chuva e um presente leve como céu sem nuvens. Sente medo dessa
novidade – dias ternos que nasceram a partir de um encontro de amor.
Pede
minha opinião em um momento que repenso: de que servem opiniões? Para encorajar
ou desencorajar?
Do
seu desabafo nasceu esse meu texto, e pela sensibilidade contida no que ela me
enviou, sei que será uma despretensiosa bússola muito mais poderosa do que qualquer
resposta objetiva.
Crescer
é a mais solitária das navegações. Você “cai” sem para-queda em um mundo que está
pronto muito antes da sua chegada.
Pai,
mãe, tios, avós, carregando seus fardos decorrentes de vivências anteriores a sua
chegada. Quantas coisas boas e outras tantas ruins já te esperavam... E você
sem culpa e sem defesa vai vivendo e muitas vezes sobrevivendo a pessoas já adoecidas
pela vida e por suas escolhas equivocadas.
Enquanto
cresce vai acumulando em si todas as idades. Dentro de você habitam todos os
seres que você foi e todos aqueles que poderiam ter sido e que acabam
envenenando o seu presente.
Ninguém
tem apenas 15,30 ou 50 anos, carrega-se também aquele bebê de um mês, dois
anos, o adolescente de doze, quinze anos, enfim, todos os outros “eus” que muitas
vezes estão carregados de decepções, raiva, medo, solidão, palavras não ditas, não
ouvidas, mágoas não reveladas. Todos esses “eus” te recriminam, censuram, amedrontam,
desconfiam na intenção de te proteger da dor que um dia vivenciaram, e, temendo
sentir novamente, boicotam as novas possibilidades.
“Eus”
que emergem lembrando o que não receberam, o que podia ter sido e não foi. Sei
que não há como livrar-se deles, mas eles podem ser silenciados para que você
possa viver em paz, deixando vir à tona o melhor de si e podendo assim, receber
o melhor do mundo.
Sempre
chega o dia em que você deixará de ser filho, neto, sobrinho, para tornar-se você.
Momento difícil, onde esses “eus” estarão lá, atravancando o caminho, preso ao
que aconteceu e também ao que jamais aconteceu enquanto você crescia.
Perguntas
invadem.
Nasci na família certa?
Ou o momento é que foi ruim? O que saiu errado?
Quem
sabe?
Não
vale se consumir e nem se resumir... Foi como tinha que ser.
E
um dia tudo modifica. Silenciam-se os muitos “eus” que teimam em te puxar para
trás. Aquela criança que mora em você, também amadurece.
De
repente encontros acontecem e você descobre-se inteiro, e um dia descobre um
outro.
E
se dá o encontro.
Com
alguém que vê a vida pelos seus olhos.
Como isso aconteceu? Onde
eu estava? Onde ele estava?
Pergunta
é o sal da vida. Para que respostas?
E
vocês se deixam aspirar um pelo outro.
Vocês
atravessaram céus para pousarem no mesmo ninho e permanecerem lado a lado, pelo
tempo que tiver que ser.
Nasce
assim a história de vocês dois. E ela é livre, é doce, é canto.
Livre
de medos.
Sem
reservas.
Achando-se
e perdendo-se na convicção de que cada amor tem a sua eternidade.