Acho que fiz bem menos do que poderia. E
menos ainda do que gostaria.
Plantei mais de uma árvore. Fiz três
filhos. E escrevi alguns livros. É pouco.
Não concretizei o velho projeto de uma
casa de assistência a meninas grávidas.
Não fiz o caminho de Santiago a pé.
Não adotei uma criança.
Não dediquei tudo o que gostaria aos meus
estudos de astrologia e tarô.
E ainda continuo morando na cidade em que
nasci.
Cresci acreditando que viver era algo mais
do que estudar, trabalhar, formar família.
O sinal mais presente na minha trajetória
foi o de interrogação. Perguntas choveram sobre mim desde a primeira vez que
percebi o mundo. Lembro-me quando de frente para o mar perguntei como alguma
coisa podia ser infinita e ninguém soube me responder. Compreensível.
A morte me incomodava desde que ouvi no
colégio de freiras onde estudei que ficaríamos para sempre ao lado de Deus. Que
tédio! Entender que a dinâmica era outra, me deu gás para "tentar" a
vida.
Me achei menos "esquisita" ao
ouvir de uma pessoa, a pouco tempo, que perguntas são mais importantes que respostas.
Indevida. Foi assim que cresci me
sentindo. O mundo era diferente de mim (ou vice e versa) - não há aqui nenhum
juízo de valor - mas diferenças sempre incomodam.
Quase tudo o que eu tinha como verdade,
derrubei ao longo dos anos. Deixei de achar que os homens são todos iguais,
que mulheres são sempre vítimas, deixei de condenar quem fez a opção por não
ter filhos, não acredito mais que possa existir amor incondicional na
humanidade atual.
Casei pela segunda vez sem nenhum tipo de
temor, se não desse certo novamente, já conhecia os caminhos a serem trilhados.
Tive outro filho quando meu primogênito completava 15 anos. Amei começar tudo
de novo.
Não sou dada a aventuras. De nenhuma
natureza. O máximo que me permiti foi entrar, segura por uma corda, em uma
cachoeira imensa em Alto do Paraíso. Mas escalaria as montanhas do Himalaia
para participar de um festival de Wesak. Tudo depende do objetivo final.
Preciso de chão firme, já que parte de mim
vive no espaço sideral.
Pouca coisa me tira a paz. A decepção é a campeã.
Queria certezas sobre quais pessoas merecem o meu melhor. Impossível saber. Não
há culpas, nem culpados, o que há são momentos e a poderosa escala de valores.
Não criar expectativas é um bom antídoto contra essa mal. Tenho tentado.
Queria certezas quanto ao meu casamento. Homens
se aventuram mesmo sabendo que essas relações são passageiras e mais perigosas
que saltos de pára-quedas. Arriscam tudo por nada. Claro que corro o mesmo
risco de todas as mulheres, e detesto isso. Os homens também correm, óbvio. A
grande maioria das mulheres, assim como eu, jamais arriscaria tudo por nada.
Como não me aventuro nem mesmo sobre uma infantil montanha russa, certamente
minha entrega seria segura, em águas calmas dentro de gôndolas em Veneza.
Certamente apostando no "para sempre". Tão diferente do "foi só
essa noite", do sexo oposto.
Viver é um risco constante. Queria que
fosse diferente. Não sei sobre como serão meus filhos, suas esposas e meus
netos. Tenho 44 anos e uma avó de 92, que lúcida e ativa me disse hoje que quem
pode se expressar livremente terá para sempre 15 anos.
Sigo acima de tudo fiel a mim, pois independente dos resultados nunca ficarei perdida.